quinta-feira, 30 de agosto de 2012

JAPONESES PERSEGUIDOS NA ERA VARGAS


A história merece mais respeito

Jeffrey Lesser e Roney Cytrynowicz (*)

Idioma proibido

Os imigrantes japoneses e seus descendentes foram duramente reprimidos por parte do governo de Getúlio Vargas, e alvos de uma violência dirigida. Primeiro foram sujeitos a restrições que atingiram a todos os grupos estrangeiros, como falar línguas consideradas "estrangeiras" e ensiná-las em escolas. Mas no caso específico da comunidade japonesa em São Paulo, a repressão foi mais direta e violenta, porque havia um racismo específico por parte do Estado Novo contra o grupo – o que está muito explícito, por exemplo, na obra de Francisco Campos, um dos ideólogos do governo Vargas.

Nas décadas de 20 e 30, os japoneses constituíram o grupo que mais emigrou para o Brasil. Em 1934, uma nova lei, restringindo a entrada de imigrantes, teve como alvo direto os japoneses. O racismo era, de certa forma, o terrível inverso do desejo de conhecer e partilhar da cultura japonesa e do admirado modelo de desenvolvimento do Japão, além das inovações de seu tipo de cooperativismo e do sucesso da produção em pequena propriedade de base familiar alcançada pelos imigrantes nos anos 40, em São Paulo.

A eclosão da Segunda Guerra Mundial, o ataque japonês a Pearl Harbour e o alinhamento do Brasil aos aliados constituíram o cenário para o governo Vargas agir com violência contra os imigrantes. Além de serem constantes vítimas de batidas policiais arbitrárias, eles foram expulsos da cidade portuária de Santos, de regiões da cidade de São Paulo, como as redondezas da Rua Conde de Sarzedas, e deportados para o interior do estado.

A proibição de falar japonês, de ensinar a língua e de ler jornais em japonês isolou completamente os imigrantes do ambiente à sua volta, porque muitos, talvez a maioria, viviam em pequenas localidades rurais no interior, onde provavelmente a distância em relação à capital não era maior do que a dos habitantes não-imigrantes.

As restrições e o isolamento criaram uma barreira intransponível que impedia os imigrantes japoneses de tomar conhecimento dos acontecimentos que envolviam a guerra. Para eles, transmitir a língua japonesa era condição sine qua non para a continuidade de sua cultura e organização social. Isto porque era por meio da língua que se transmitiam valores – como respeito aos pais e aos mais velhos – que garantiam a própria estrutura econômica da agricultura dos imigrantes, baseada no trabalho familiar sobre a liderança do pai.

 

(*) Professor de História na Emory University (EUA) e autor dos livros O Brasil e a Questão Judaica (Imago, 1995) e Negotiating National Identity. Immigrants, Minorities, and the Struggle for Ethnicity in Brazil (Duke University Press, 1999), a ser editado em português pela Editora da Unesp.

 

(**) Historiador, doutor em História pela USP, autor de Memória da Barbárie. A história do genocídio dos judeus na Segunda Guerra Mundial (Edusp, 1991) e de Guerra sem guerra. A mobilização e o cotidiano em São Paulo durante a Segunda Guerra Mundial (Edusp/Geração Editorial, no prelo).

 

In: www.observatoriodaimprenssa.com.br/artigos

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